Crônica
Admiráveis são as mudanças de costumes dos
brasileiros, impulsionados por outras sociedades, principalmente a européia, em
relação a esses maravilhosos seres, os cães. Ao menos nas grandes cidades, os
cuidados com a alimentação, saúde e higiene dos animais e limpeza nas vias e
logradouros públicos, quando vão aos passeios com seus cães, os brasileiros são
exemplares.
Acerca
de vinte anos passados quando morei nas vizinhanças de Paris, presenciei vários
acontecimentos curiosos e até repugnantes no tocante à relação dos franceses
com seus animais. Nas manhãs de domingo, eu me dirigia a pé à feira livre, no
centro da cidade de Poissy, distante mais ou menos um quilômetro do hotel em
que morava, e no percurso me deparava com grande quantidade de montículos e
montões de fezes caninas deixadas em plena calçada, pelo desleixo, mau costume e falta de educação dos donos
daqueles animais, e não raro lá estava pela via, sinais de pedestres
desavisados que ao pisar os horríveis dejetos, arrastavam as solas de seus
sapatos a título de se desfazerem de tamanho incômodo, deixando rastros tal
como pinceladas artísticas de pintura abstrata.
Em
outra oportunidade num sábado à noite,
fui junto a alguns amigos a uma festa popular a qual chamavam por “fete des
lojes”, parecida com nossas festas juninas,
na cidade de San German, distante
seis quilômetros, e lá rumamos a uma grande barraca de culinária alemã, com
longas mesas onde saboreamos joelho de porco com chucrute, ou (Sauerkraute).
Numa mesa visinha à nossa havia um casal que aparentava trinta anos de idade e
com eles traziam um grande cão da raça pastor alemão, que tomava assento à mesa
entre seus donos e degustava a refeição que cuidadosamente lhe serviam, alem de
depois da refeição, a mulher ter pedido ao marido que a fotografasse abraçada ao cão, o que na minha visão de
turista tupiniquim, se constituía em exagero jamais visto, o que nos dias
atuais não mais me surpreende.
Certa
manhã de sábado eu viajava de trem de Poissy a Paris, um percurso de quarenta
minutos, e logo que me sentei vi algo curioso e que me fez pensar,...
transgredir não é privilégio de brasileiros; à minha frente viajava uma jovem
muito bem vestida, portando várias sacolas e em uma delas estava um cãozinho
preto que teimava em por a cara pra fora e era empurrado de volta sob protesto
de sua dona que o escondia novamente, tendo isso se repetido várias vezes, pelo
que deduzi ser proibido transportar cães nos trens.
Entre
nós no Brasil, as transformações são lentas porem contundentes e os costumes
suplantam regras e leis; me lembro que há anos passados era terminantemente
proibido ter cães e gatos em apartamentos, sendo que os transgressores eram
sujeitos a penalidades e multas, e hoje há a inconsistente recomendação para
que se transporte o cão ou gato no colo e pelo elevador de serviço, e pelo que
tenho visto não é cumprido à risca, transportam às vezes o cão pelo elevador
social mesmo! Não sou contra isso, afinal o cão é o nosso melhor amigo. Não
tardará o dia em que um parlamentar elaborará um projeto de lei criminalizando
por preconceito, maus tratos ou o que o valha aos síndicos de edifícios que insistirem no
cumprimento da determinação.
No
Brasil, os produtos, serviços e cuidados veterinários, dentários, psicológicos,
festas de aniversário, desfiles e concursos de beleza e talhe racial, etc.
estão em franca ascensão, um negócio rentável e em expansão.
Retomando
a frase “o cão é o melhor amigo do homem”, lembro-me de que em minha infância,
houve um episódio digno de registro. Havia no lugarejo, hoje cidade de Juritís,
dois amigos inseparáveis: Zé Caetano e Chico Faustino, companheiros de
trabalho, de pescarias e outros entretenimentos entre os quais o de beberem
juntos nos bares,o que às vezes desvirtuava em conflito e luta corporal, em que
certo dia os amigos se desentenderam e Ze Caetano estava em vantagem, surrando
o amigo que apelou pelo seu cão “vira latas”, “pega titiu”! gritou Chico
aflito, e o animal avançou feroz, mordendo e sacolejando a nádega do agressor
que parou imediatamente com a pancadaria, rumando imediatamente para o pronto
socorro em busca de cuidados médicos. Devo ressaltar que o episódio não puzera
fim à amizade e ainda deu lição de tolerância aos contendores e o respeito de
ambos ao cão herói.
Recentemente,
num domingo à tarde, fui à casa de um amigo e colega de trabalho que fora acidentado, o Claricio, para visitá-lo
e enquanto conversávamos sentados no sofá da sala, eis que apareceu com um
aspecto triste e cabisbaixo um caozinho de estatura média e corpo delgado, de
cor amarelada, chegando onde eu estava cheirou-me timidamente ao que lhe fiz um
afago e tentei agradá-lo, porem fez meia volta e foi-se embora. Claricio
disse-me que o cãozinho ao vê-lo chegar à sua casa após o acidente, com o rosto
coberto por curativos e um braço engessado não pulou em seu colo como era de
costume e ficou recluso em seu canto, triste e não comeu nem bebeu durante dez
dias, o mesmo periodo em que Claricio não se alimentou pela gravidade de seus
ferimentos. À véspera de minha visita, em que Claricio voltou a se alimentar, o
caozinho o secundou bebendo e comendo, tendo ficado seriamente enfraquecido
fisicamente pelo amor e apego a seu
dono. Eu fiquei comovido e emocionado com o relato do meu amigo.
Eu
sempre me emociono muito ao encontrar uma visinha na garagem do estacionamento
do condomínio em que moro, ao sair ou chegar encontro-a com seu cãozinho idoso
e obeso que sofre de mal cardíaco e ela sabe por informação do veterinário que
seu cão não viverá por muito tempo, ela se emociona e chora ao falar nele com a
certeza de que vai perdê-lo.
Dia
destes o Nelson, meu amigo e colega de trabalho contou-me algo engraçado e que
prova mais uma vez o que eu disse sobre os bons costumes dos brasileiros no
tocante ao asseio com seus cães nas vias públicas. Nelson é proprietário de um
apartamento em Praia Grande, no litoral sul e pra lá vai aos fins de semana em
busca de lazer e fazer novas amizades. Num domingo pela manhã uma senhora sua
vizinha disse-lhe: - senhor Nelson, os
trombadinhas de Praia Grande não respeitam mais nem as fezes dos cachorros,
acredita que eu ia eu pela calçada com meu cachorro e a sacolinha com as fezes
dele quando abruptamente apareceu em desabalada carreira um deles que arrancou
de minha mão a sacola, dobrou a esquina
e desapareceu. Ainda gritei ao rapaz, isso são fezes de cachorro, é lixo! porem
ele não me ouviu, tal o ímpeto da ação delituosa que acabara de praticar.
Imagino a frustração dele ao conferir o produto do roubo!
Minha
irmã Rosa, falando-me sobre seu convívio com suas duas cadelas, disse ser a
Mag, uma labrador já idosa, muito disciplinada, que não faz suas necessidades
fisiológicas na rua ou em qualquer lugar que não seja o seu espaço no fundo do
quintal em hipótese alguma; já a Nic, uma vira latas, de pequeno porte e mais
jovem que a outra e recebe os mesmos cuidados, é completamente indisciplinada e
não assimila as lições de adestramento.
Recentemente,
uma segunda feira muito fria, às seis horas da manhã, ao descer pelo elevador
em direção à garagem, estava um jovem casal de moradores de um andar superior
ao meu com seu cão, não sei qual a raça, só sei que tinha porte médio e era
branco como uma pluma e tremia muito nos braços da jovem e eu disse-lhes: - ele
deve estar com frio, - estava realmente
muito frio. A jovem me disse, não é isso, ele sabe que vai ao pet shop e tem
muito medo de lá. Pensei, ... esse cão precisa é de
tratamento psicológico, porem creio ser ainda no Brasil, limitado esse cuidado
aos cães, ou quem sabe o jovem casal é quem precisa de ajuda psicológica para
melhor se relacionarem com seu cão, ou buscarem a ajuda de “O encantador de
cães”, Cesar Millan, o mexicano de Culiacán radicado Los Angeles nos Estados
Unidos, o fundador do centro de psicologia canina e autor de varios DVDs e
livros dedicados à felicidade dos cães e seus felizes proprietários.
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